Médicos e odontólogos devem contratar seguros profissionais de responsabilidade civil?

A discussão é antiga e, quase vinte anos atrás, já foi até avaliada pelo Conselho Federal de Medicina, que, na época, chegou a desaconselhar a contratação.  Mas os tempos já são outros e é preciso ter ciência de alguns fatores. Veja, no texto abaixo, alguns aspectos de essencial importância para esse tipo de contratação.

Em 2003 o Conselho Federal de Medicina editou uma nota de esclarecimento indicando pela não contratação de seguros pois, na visão das entidades nacionais médicas, as apólices teriam coberturas limitadas, com condenações superiores aos oferecidos, na época, pelas seguradoras.  Havia também o receio de que a contratação do seguro fosse uma causa de estímulo à judicialização. Além disso, havia a preocupação com a possível escalada dos valores pagos para a seguradoras, valores esses que passariam a ser indispensáveis e causariam um crescente desinteresse dos médicos em atuar em determinadas especialidades (obstetrícia, por exemplo).

De certo modo, essa já tem sido a realidade nos Estados Unidos. Um cirurgião, naquele pais, chega a pagar mais de cem mil dólares anuais apenas com a contratação de seguro profissional. E, caso o médico não tenha seguro, nem é aceito pelo hospital.  Há estados inteiros que não possuem um só obstetra – as pessoas viajam para outros estados apenas para ter seus partos.  E sim: lá, as indenizações podem chegar a cifras milionárias, onde apenas um processo pode destruir a vida profissional e financeira de um médico ou de uma empresa médica. 

Mas essa não é (ou ainda não é) a situação atual no Brasil.  É evidente que estamos presenciando um aumento gigantesco no número de processos judiciais por acusações de erros médicos.  Mas os valores das condenações ainda não chegam a ser absurdos e as causas são analisadas caso a caso. 

Uma das principais mudanças é o exponencial aumento da judicialização contra médicos.  Muitos são os números.  Algumas entidades afirmam um crescimento de mais de 1600% do número de processos.  Outras afirmam que 7% dos médicos enfrentam algum tipo de processo.  De todo jeito, o crescimento é notório e assustador.

Hoje, até mesmo associações de vítimas de erro médico são formadas.  Grupos inteiros de WhatsApp são criados apenas falar mal de um médico. Vivemos outra realidade.

Mas apenas para se ter uma ideia, nos dias de hoje, apenas a título de comparação com seguro de proteção veicular, é muito mais fácil um médico ser processado por um paciente do que ter uma colisão grave no seu veículo.  Daí a importância da contratação do seguro.  A maioria das pessoas que tem veículos não saem de casa sem seguro.  Então por que sair para trabalhar descoberto?

Além disso, as seguradoras passaram a adotar uma metodologia de trabalho mais discreta, não deixando que o paciente saiba que o médico contratou seguro.  Em 2003, elas não sabiam lidar tão bem com a situação, chegando a procurar o paciente para um possível acordo – isso era prejudicial, pois fazia com que os “olhos do paciente crescessem”. 

Outra diferença também é que os valores pagos às seguradoras ainda são relativamente baixos.  É possível contratar coberturas, por exemplo, de mais de quinhentos mil Reais com o pagamento de menos de dez mil Reais por ano.

Portanto, no Brasil, ainda vale muito a pena ter a segurança fornecida por esse tipo de cobertura contratual. Os custos ainda são baixos.  As seguradoras sabem se comportar e não aparecem no processo nem procuram os pacientes para tentar uma negociação por fora (como era no começo).  E, com isso, o profissional trabalha bem mais tranquilo.  Claro que todo processo causa ansiedade, mas só o fato de saber que a parte financeira está coberta, já melhora bastante.

Para a contratação, o médico precisa procurar seguradoras devidamente credenciadas, autorizadas pelo órgão fiscalizador, SUSEP (Superintendência de Seguros Privados) e que trabalham especificamente com esse tipo de responsabilidade médica. Ao que se sabe, as seguradoras são:  Seguros Unimed, Mapfre, Chubb, Argo Protector e Excelsior, sendo as duas primeiras as mais conhecidas neste ramo específico.

Há também as associações que vendem esse tipo de seguro. Porém há toda uma discussão sobre sua legalidade, onde ações judiciais foram ajuizadas perante Tribunais Regionais Federais no sentido de se conseguir ordem judiciais determinando a proibição.  A Advocacia Geral da União entende que pode haver prejuízo para os consumidores e que a atuação dessas associações é irregular. A OAB Nacional também ajuizou uma ação que questionou o oferecimento de serviços jurídicos casados com o de seguros por uma determinada associação.  Claro que as associações também tem seus argumentos.  Então, talvez seja mais prudente aguardar as decisões judiciais definitivas.

Portanto, a orientação que se passa é: procure um corretor que tenha experiência na cotação desse tipo de seguro – seguro profissional de responsabilidade civil.  É preciso que ele tenha a expertise para analisar especificamente o seu caso, determinando qual é a cobertura ideal para o seu tipo de atuação (especialidade, se exerce função de preceptoria, se atua em pronto-socorro, etc.).  Ele vai fazer uma pesquisa, por exemplo, para saber quanto tem sido as condenações para uma determinada especialidade, não lhe vendendo uma cobertura que fique além ou aquém no necessário em uma seguradora devidamente credenciada na SUSEP.

E, claro, seguro é um contrato, e é recomendável que ao contratar qualquer coisa, que se submeta a uma análise por um advogado de sua confiança. 

Como sempre, em caso de dúvida, estamos à disposição.

Renato Dumaresq.

OAB/RN nº 5.448